Quercus apela ao Ministro do Ambiente para limitar biocombustíveis com impacte climático
A Quercus escreveu esta semana uma carta formal ao Ministro do Ambiente e Energia sobre a posição de Portugal acerca da proposta da Comissão para a revisão da política europeia de biocombustíveis (1). Decorre hoje em Bruxelas, a primeira de três reuniões de COREPER para discussão e negociação entre os Estados-Membros sob a presidência da Lituânia, e na preparação dos trabalhos do próximo Conselho Europeu de Ministros da Energia, em dezembro próximo, onde Portugal deverá ter uma palavra a dizer.
A Quercus considera que o sentido das negociações entre os Estados-Membros ao nível do Conselho está a bloquear o propósito da proposta inicial da Comissão. A Quercus apelou ao Ministro do Ambiente e Energia para os seguintes aspetos:
- Portugal não pode apoiar as pretensões da Presidência Lituana e de alguns Estados-Membros (como a Espanha e a Polónia) que visam metas para o uso de biocombustíveis de produção agrícola acima da proposta inicial da Comissão ou do compromisso do Parlamento Europeu
Limitar o uso de biocombustíveis produzidos a partir de culturas agrícolas na Europa é um passo importante para, não só limitar as emissões de GEE no sector dos transportes, mas também poupar dinheiro dos contribuintes e dos governos dos Estados-Membros, e assim aliviar a pressão sobre o mercado global de alimentos. Neste sentido, o limite de 5% proposto pela Comissão (ou de 6% como compromisso defendido e estabelecido pelo Parlamento Europeu) para os biocombustíveis de produção agrícola deverá ser reforçado pelos Estados‑Membros no Conselho (e não enfraquecido). Esta sub-meta deve ser alargada para cumprimento das Diretivas RED e FQD e abranger todos os biocombustíveis a partir de culturas agroalimentares que possam competir de forma direta com a produção de alimentos, ou de forma indireta (incluindo culturas energéticas, como o capim-elefante e culturas florestais de curta rotação).
- Portugal deve apoiar a introdução de fatores de emissão de GEE específicos para as alterações indiretas de uso do solo (de carácter obrigatório e não voluntário), considerando todo o impacte climático dos biocombustíveis
A produção de biocombustíveis gera emissões significativas associadas com as alterações indiretas de uso do solo (ILUC, da sigla em inglês) (2) e podem, em alguns casos, até contribuir para um aumento das emissões de GEE comparativamente com os combustíveis fósseis, facto evidenciado por estudos científicos da autoria de várias instituições de renome (como a OCDE, FAO, JRC, FAO, UNEP e a própria Comissão). Portugal deverá apoiar a decisão da Comissão de Ambiente do Parlamento Europeu, a qual votou em julho passado a favor da introdução direta de fatores de emissão de efeito ILUC, a incluir entre os critérios de sustentabilidade em ambas as Diretivas RED e FQD a partir de 2017. Consideramos esta premissa fundamental baseada no melhor conhecimento científico disponível e no respeito pelo princípio da precaução que rege as políticas europeias, alinhando a posição de Portugal com a de países como o Reino Unido, Bélgica, Holanda, Dinamarca e Finlândia, os quais pretendem contabilizar todo o impacto dos biocombustíveis no sector dos transportes e colocar este sector no caminho da redução efetiva de emissões de carbono.
- Portugal deve instar a Presidência Lituana a reintroduzir uma sub-meta para os biocombustíveis avançados, desde que garantidos critérios de sustentabilidade, e um sistema de múltipla contagem para a mobilidade elétrica
A Quercus considera fundamental que os Estados-Membros possam recorrer a alternativas mais sustentáveis - produzidas a partir de resíduos agrícolas e florestais, valorização de óleos alimentares usados e biogás proveniente de digestão anaeróbia de resíduos urbanos - do que os biocombustíveis de produção agrícola, desde que o seu uso seja condicionado ao cumprimento de práticas sustentáveis de gestão agrícola e florestal, para proteger a saúde dos ecossistemas, e no respeito dos princípios da utilização eficiente dos recursos e da hierarquia de resíduos.
Estas soluções poderiam levar a uma redução significativa das emissões de GEE em 2020, apoiando o desenvolvimento de indústrias inovadoras de produção mais limpa, e que são uma grande fonte de emprego. Portugal deverá ainda desenvolver esforços junto da Presidência Lituana de modo a garantir a múltipla contagem para a mobilidade elétrica, com vista ao cumprimento da meta global de 10% de energias renováveis no setor dos transportes, sendo esta uma questão estratégica para o nosso país.
Na semana que inicia a COP19 em Varsóvia e em vésperas do Conselho Europeu da Energia, a Quercus destaca que a UE estará a comprometer os seus objetivos de política climática defendidos em negociações internacionais, se não rever a sua política sobre os biocombustíveis, representando uma séria ameaça para a segurança alimentar e o ambiente.
Lisboa, 13 de novembro de 2013
A Direção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza
(1) Proposta da Comissão Europeia para a revisão das Diretivas sobre as Energias Renováveis e Qualidade dos Combustíveis no que diz respeito aos biocombustíveis http://ec.europa.eu/clima/policies/transport/fuel/docs/com_2012_595_en.pdf
(2) As alterações indiretas de uso do solo resultam da desflorestação e conversão de pastagens para produzir alimentos, devido à conversão de terras agrícolas para o cultivo de biocombustíveis.
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Governo polaco ganha segundo “Fóssil do Dia”
O galardão das ONG para as piores prestações nas conferências do clima foi ontem atribuído ao Governo da Polónia, país anfitrião da COP19, pelo seu papel de “relações públicas da indústria do carvão”. A lista de razões é das mais extensas de sempre, e inclui o facto do país continuar a opor-se a que a UE assuma compromissos mais ambiciosos em matéria de alterações climáticas, bem como à circunstância de, em simultâneo com a COP, ter decidido co-organizar uma cimeira sobre carvão, em vez de promover um encontro sobre energias renováveis.
Os activistas da Rede de Ação Climática (CAN, na sigla em inglês) também não perdoam que a Polónia tenha convidado para patrocinadores da COP19 um conjunto de empresas poluidoras que se opõem a uma acção climática mais ambiciosa, nem a escolha da organização Business Europe para representar o sector empresarial nos eventos pré-COP.
Outros motivos foram os ‘posts loucos’ publicados na página oficial da COP19 sobre as vantagens económicas resultantes do degelo no Ártico, com a possibilidade de se perseguir “piratas, ecologistas e terroristas” no mar; e a recente publicação de retórica negacionista na aplicação móvel da conferência, com a frase “as alterações climáticas são fenómenos naturais que já ocorreram muitas vezes na Terra”.
Mas nem tudo são más notícias para a Polónia, dado que o “Raio do Dia” foi atribuído aos polacos que recusam estar dependentes de um desenvolvimento baseado no carvão e defendem as energias renováveis. Segundo as sondagens, 89% dos polacos querem mais energia proveniente de fontes renováveis, e mais de dois terços (70%) defendem uma política energética que apoie as energias renováveis.
Além disso, 73% dos polacos querem que o seu Governo se envolva mais nas ações globais para prevenir os efeitos negativos das alterações climáticas. “Com este raio dizemos: Obrigado, polacos, por apoiarem um futuro sem o caos climático. É mais que tempo do primeiro-ministro Tusk e do seu Governo ouvir o seu povo e iniciar uma revolução energética baseada na eficiência energética e nas energias renováveis. Toda a energia renovável para o povo polaco!” [Fonte: CAN International]